Eu sou o leite.
E eu estava morrendo de saudade.
Eu sou um lugar que você quer voltar
Uma casa e um ninho que não te pertencem mais.
Sou um sabor azedo na boca
E um abraço demorado.
Sou cada uma das estrelas
Que perpassam o firmamento.
E em cada seio de cada mulher
Sou uma porção de um oceano branco e imaculado
Em cada uma delas
Em cada mama
Que Deus pôs.
Sendo assim, sou um tipo de mundo líquido
E você é um tipo de criatura,
Uma nereida ou um tritão
Querendo voltar pra casa
A Via Láctea
O seio de mamãe
Tanto faz, estamos indo de volta pra casa.
Eu sou uma tentativa
De recomeço, eu sou seu primeiro amor
Eu sou seu primeiro sabor
Eu sou um tipo de frustração
Que o seu corpo não tolera mais.
Mas sente falta, lá no fundo
Às vezes sinto saudade de passear aqui
Ficar e dormir
Eu sou o leite.
Eu amo me sentir tão pequeno
Frágil e adormecido no seu peito ou dentro do seu útero
Sonhando com uma aventura fantástica pelo espaço
Você como um bebê-Deus, mamãe
e uma vaca branca de manchas pretas nos acompanhando.
Todos juntos caminhando sobre mim, na minha forma de oceano.
Escrevendo juntos
A mais linda história já criada.
Eu sou o café.
Eu sou aquele que te recebe em casa com um abraço
E te faço parte do meu mundo.
Sou o seu namorado e também sou sua mãe.
Mas posso ser seu melhor amigo ou seu chefe, se você quiser
e tiver tempo.
Eu sou quem te acalma e estabiliza
Quando te faltam palavras e ar
De uma carta inexplicável
De um sonho ruim
De uma lembrança dilacerante.
Eu sou a oferenda ao sol de cada manhã sua
E o companheiro da madrugada.
Eu sou a única coisa que você dá de manhã
Eu sou o som dos seus dedos no teclado do PC
Na sua necessária (?) solidão
Mais que tudo
Eu fui e sou o presente.
Eu ainda estou aqui.
Não sei se acordado ou com sono
Não sei se quente ou frio
Mas com o mesmo cheiro e com a mesma cor
Porque eu não me deterioro
Ainda líquido, talvez ainda mais líquido do que antes.
Eu sou o café, tentando entender
Cada palavra
Prestando atenção em cada palavra sua
Sem pressa, assoprando com cuidado pra não queimar
Dormindo e acordando
Manchando sonhos com café
Perfumando hálitos com café
Persistindo e invadindo os cômodos da casa com aroma de café
Dizendo que ainda estou aqui.
Unaí, 31 de dezembro de 2012.